Seishun Buta Yarou Series

Seishun Buta Yarou Series – Volume 02, Capítulo 1

Iniciando de fato a tradução do segundo volume. Ah, em relação à publicação com as ilustrações, eu talvez só atualize-a no final do volume, pois tem alguns títulos que ainda não são definitivos e quero ver se a tradução deles está correta mesmo ao ler o capítulo em si. (10563 palavras – capítulo revisado 17/11/18)


Capítulo 1

Não Existe um Amanhã para um Traste


06

“Muito bem, equipe do Japão!” O grandemente animado apresentador começou o noticiário da manhã. “Bom dia, hoje é Sexta-Feira, vinte e sete de Junho. Acho que vamos começar o dia com o futebol!”

A TV na sala estava mostrando os destaques de uma partida da copa do mundo que havia acontecido no outro lado do planeta. Este era o segundo jogo da fase de grupos e tinha passado de madrugada no Japão. Foi logo antes do intervalo, a equipe japonesa estava um gol atrás. O camisa 10 havia driblado com a bola todo o caminho pelo campo, mas foi derrubado por uma defesa extremamente fervorosa dos adversários. O apito soou pelo estádio e eles ganharam uma cobrança de falta logo atrás da grande área.

O camisa 4 colocou a bola no chão e gradualmente caminhou para trás. Você podia sentir a tensão, até através da tela.

Sakuta observava a tela distraidamente.

“Eu já… vi isso.”

Ele não teria assistido a um jogo que passou ao vivo de madrugada. Sakuta havia assistido esses destaques ontem de manhã. A bola iria passar pelo goleiro e se enterrar na rede do gol.

Prendendo a respiração, Sakuta observou o destaque. A bola arqueou pela trajetória, assim como Sakuta se lembrava, voando em direção ao gol.

Eles haviam empatado e seus oponentes estavam mordendo os lábios em desespero. O camisa 4 deu um grito de triunfo, ecoado pelos outros jogadores e seus torcedores.

Com o ímpeto desse gol, a equipe japonesa havia conseguido mais um gol no segundo tempo e mantido essa liderança para uma gloriosa vitória.

Os resultados se desenrolaram exatamente como ele se lembrava, então, para se assegurar que não tinha perdido a cabeça, ele voltou para seu quarto para checar seu despertador. Este ficava ao lado da cama, e seu mostrador digital indicava a hora, como também a data.

27 de junho.

A mesma que o locutor acabara de reportar.

“O que… diabos…” A partir do que Sakuta se lembrava, hoje deveria ser dia vinte e oito. Porém, tanto a TV quanto o relógio diziam que era vinte e sete. Então hoje era ontem e ontem era hoje. “…Entendo, um sonho.”

Sakuta voltou para a cama, se cobriu novamente com o edredom e voltou a dormir.

Se hoje fosse ontem, ele poderia dormir até amanhã. Bem no momento em que ele teve esse pensamento e fechou os olhos, a porta se abriu.

“Onii-chan, você não estava acordado?” Ele ouviu a voz de sua irmã. Ela se aproximou com passos bem silenciosos. “Você não pode voltar a dormir, acorde.”

Ela o sacudiu.

“Estarei dormindo até amanhã.”

“Estará tudo bem se você faltar da escola?”

“Sim.”

“Então eu vou dormir com você”, disse ela, enquanto se enfiava no edredom.

“Eu vou me levantar então.”

Ele levantou-se abruptamente.

“Eh? Tão rápido!?”

Ele se levantou, quase como se estivesse escapando de Kaede enquanto ela subia na cama vestindo seu pijama de panda. Ele moderou seu escapismo e voltou para a sala de estar. O noticiário da manhã ainda estava falando sobre o futebol.

Kaede veio andando logo atrás dele.

“Hey, Kaede.”

“Sim?”

“Eu vou te perguntar algo meio estranho.”

“N-não é algo pervertido, né?”

“Não é.”

“V-você não pode fazer algo desse tipo, Onii-chan”, disse ela enquanto se contorcia e cobria o rosto, não ouvindo-o.

“Você viu esta notícia ontem?”

“…A notícia sobre futebol?” Ela perguntou, espiando por um espaço entre os dedos.

“Sim.”

“Umm, eu não vi?”, Kaede quase perguntou, confusa com o que ele estava questionando e franziu a testa ligeiramente.

“Eu imaginei… tudo bem então.”

Quando respondeu, Sakuta sentiu uma sensação de mal-estar se formando em seu estômago, como se ele estivesse prestes a se envolver em algo ruim.

Ainda se sentindo como se estivesse em algum tipo de alucinação, Sakuta tomou o café da manhã com Kaede e, ainda não entendendo nada, partiu para a escola.

Talvez isso ficasse claro se ele saísse, pensou ele.

“Vejo você mais tarde, Onii-chan.”

Kaede observou-o sair com um sorriso. Ao contrário de seu costume, ele se dirigiu para a estação enquanto prestava bastante atenção à sua volta. Ele passou pelos apartamentos e pelas casas que se alinhavam nas ruas, ao lado do parque e cruzou a ponte que dava para a rua principal. Enquanto se aproximava da estação, sua visão foi preenchida por hotéis de negócios e atacadistas de eletrônicos.

Ao longo da caminhada de Sakuta, não havia nada que se destacasse para ele. Havia outras pessoas indo para a mesma estação que ele, donas de casa levando o lixo para fora e até mesmo o velho que cuidava da floricultura varrendo em volta da loja.

Ele levou cerca de dez minutos para caminhar até a Estação de Fujisawa, que ficava bem no meio da cidade de mesmo nome, na Prefeitura de Kanagawa. Havia multidões de trabalhadores e estudantes andando de um lado para o outro pela área. Os trabalhadores estavam se transferindo para a Linha Tokaido e os estudantes passavam pela catraca da Odakyu1 em direção à estação Fujisawa Enoden, a mesma para a qual Sakuta iria. Nenhum deles parecia hesitar em suas caminhadas, apenas avançavam rapidamente em direção ao seu destino. Nenhum deles sequer olhava para o lado, Sakuta era o único olhando em volta de maneira inquieta, observando as ações dos outros.

“Sou apenas eu…?”

Ao passar pela catraca, ele sentiu uma sensação de desconforto formigando em sua pele, o que era de fato o caso.

Ele esperou na plataforma por dois minutos antes de embarcar no trem quando este chegou. O trem possuía um design antigo, e apenas quatro carruagens. O sino tocou para avisar sobre as portas se fechando e o trem se moveu.

Depois de serem sacudidos pelo trem por cerca de quinze minutos, eles chegaram à Estação de Shichirigahama, que ficava na costa a poucos minutos a pé da Escola Secundária de Minegahara, a escola que Sakuta frequentava. Outros estudantes com o mesmo uniforme se amontoaram na plataforma. O cheiro da brisa do mar salgado alcançou Sakuta assim que ele saiu, um sinal do verão que se aproximava. Em mais dez dias, as praias próximas seriam abertas e lotadas por pessoas que iriam nadar no oceano.

Quando ele olhou para o mar, ele podia ver várias velas de windsurfistas que estavam aproveitando ao máximo o dia claro dentro desta estação chuvosa. Esta era uma visão familiar, com nada particularmente estranho sobre ela.

O curto caminho para a escola era o mesmo de sempre, repleto de alunos da Escola Secundária de Minegahara. Havia garotos do primeiro ano brincando com seus colegas, alunos do terceiro ano com livros na mão, garotas conversando sobre a noite de karaokê que tiveram depois da escola no dia anterior…

Para onde quer que olhasse, Sakuta não conseguia ver nada além do habitual.

Não havia uma única conversa como:

“Hey, essa não é a segunda vez que hoje aconteceu?”

“Né? Para mim também, para mim também!”

“Isso está realmente me assustando.”

Era apenas Sakuta que andava desorientado, confuso devido a seu segundo dia vinte sete de junho.

“Eaí, Sakuta. Seu cabelo está desarrumado de novo”, um de seus dois únicos amigos, Kunimi Yuuma, o chamou depois que ele passou pelo portão e entrou na escola de fato.

Yuuma tinha vindo do treino com o clube de basquete, e estava usando um shorts de corrida na altura do joelho e uma camiseta. Havia muitos estudantes em clubes esportivos que iam para aulas com esse tipo de roupa e não usavam o uniforme durante todo o dia letivo, Yuuma era um deles.

“É só um penteado.”

“Uma nova tendência, huh?” Yuuma respondeu com um sorriso. Isso também era normal… na verdade, Sakuta se lembrava dessa conversa, ela era exatamente igual àquela que ele se lembrava de ‘ontem’.

Sakuta ficou em silêncio.

“O que foi, Sakuta?”

“…Nada.”

“Sério, o que foi?”

“Eu estou apenas irritado que você é tão popular.”

“Huh? O que há com isso?”

Sakuta não disse nada sobre como esta era a segunda vez que este dia acontecia e apenas seguiu a conversa até chegarem à sala de aula.

As quatro aulas que Sakuta teve naquela manhã, matemática, física, inglês e japonês, juntamente com os tópicos abordados, tudo foi idêntico ao de ontem. Mesmo o professor de matemática cantando “Isto vai cair na prova de vocês”, as piadas ruins do professor de física, o professor de inglês falando “Ouça-me, Senhor Azusagawa” e o batom na gola do professor de japonês eram todos iguais aos que Sakuta tinha experimentado ‘ontem’.

Com o passar do tempo, as dúvidas de Sakuta começaram a se solidificar em uma convicção.

Apenas minhas memórias voltaram para ontem.

Esse conceito transformou as cenas aparentemente pacíficas das salas de aula em algo assustador. Foi o mundo que havia enlouquecido ou o próprio Sakuta?

“Foi o mundo, obviamente”, ele disse para si mesmo.

Seu corpo parecia totalmente normal, preso na realidade, com nada fazendo parecer que ele estava em um sonho.

Ainda lidando com isso, a hora do almoço chegou.

“Se hoje é ontem…”

Sakuta tinha uma promessa importante para cumprir nessa pausa para o almoço, e para se certificar disso, ele deixou a sala do segundo ano.

Dez minutos depois, Sakuta estava sentado em uma sala de aula aberta no terceiro andar da escola. O mar era visível da janela e, do outro lado da mesa, estava Sakurajima Mai, aluna do terceiro ano e sua senpai.

Ela tinha uma bela expressão em seu lindo rosto. Sua aparência deixaria as atrizes envergonhadas… na verdade, ela mesma era uma atriz, uma artista com puro talento que atuava desde a infância. Ela era uma celebridade com uma fama nacional. Durante o último ano, aproximadamente, ela havia entrado em um hiato, mas retomara suas atividades recentemente.

Sobre a mesa entre eles havia um bentô que ela preparara para Sakuta, a mesma comida que ele havia comido no dia anterior.

Frango temperado e frito, ovos fritos, algas marinhas com feijão cozido, e salada de batata guarnecida com tomates cereja.

Item por item, ele usou seu hashi para levá-los até a boca para experimentar. Eles estavam ligeiramente temperados, mas todos tinham sabores suaves. Não era apenas a aparência, o gosto em si era o mesmo que aquele em suas memórias.

Completamente confuso com o que estava acontecendo, Sakuta não disse uma palavra.

“Não está com um gosto bom?”

“Hm?”

Sakuta levantou a cabeça em resposta à voz de Mai, encontrando seu olhar mal-humorado. Ela não estava escondendo seu descontentamento nem um pouco e seu olhar estava o golpeando. Perdido em seus pensamentos, Sakuta havia completamente esquecido de dar suas impressões sobre o almoço. Ou melhor, porque ele tinha a memória de ter feito isso, ele pensou que já havia feito tal comentário nesse momento.

“Está muito gostoso”, ele assegurou.

“Não parece nem um pouco que você acha isso.”

“Realmente está. Tanto que eu quero comer isso todos os dias.”

“Eu não serei enganada por uma proposta de casamento do período Showa. O que exatamente você estava pensando enquanto comia o meu almoço?”

Mai era esperta.

“Eu estava apenas pensando sobre o quão feliz me fez poder comer sua comida.”

Ele não achava que deveria falar com Mai sobre o que estava acontecendo nessa situação. Ele mesmo não sabia o que estava acontecendo, então contar a Mai suas vagas impressões dessa maneira apenas faria com que ela se preocupasse desnecessariamente.

“Hmmm”, Mai disse duvidosamente.

“Mai-san, posso te perguntar uma coisa estranha?”

“Alguma coisa pervertida?” Kaede tinha dito a mesma coisa, por que todos sempre pensavam nisso, era extremamente frustante. “Eu não vou dizer a você a cor da calcinha que estou usando.”

“Estou me divertindo só por imaginá-la, então está tudo bem.”

“Uwah, seu tarado”, ele quis dizer isso como uma piada, mas Mai recuou, “então, o que é essa coisa estranha?”

“O que eu sou para você, Mai-san?”

“Apenas um kouhai atrevido”, ela respondeu sem hesitar um momento sequer, certificando-se de enfatizar o “apenas” para perturbar Sakuta.

“…Entendo. Então o que você acha que é para mim?”

“Uma beldade… a qual você tem um amor não correspondido, sua muito gentil senpai que você deseja do fundo do seu coração.”

“Isso mesmo”, enquanto falava, ele levou um ovo até a boca e o mastigou. Era uma verdadeira pena, mas a relação entre eles havia retornado ao que era antes, embora ela tivesse concordado em ter um encontro com ele antes.

Eles deveriam já ser namorado e namorada, mas ele regrediu a ser um kouhai atrevido. No entanto, se algum fenômeno estranho estava atrapalhando o romance de Sakuta, ele só precisava arranjar outro encontro com Mai.

Ele não podia começar a ficar de mau humor por causa de um contratempo tão pequeno, desistir era algo impensável.

“Essa realmente foi uma pergunta estranha, sério, por quê?” Mai olhou em dúvida para ele.

“Eu pensei que deveria me certificar que sei qual é a situação antes de seguir em frente”, Sakuta se esquivou da pergunta com o que parecia ser uma razão plausível. Ele não havia mentido, ele realmente queria saber o que estava acontecendo com essa situação incompreensível.

“Eu meio que duvido disso”, disse Mai enquanto semicerrava os olhos, olhando para o rosto dele.

“Mais importante, Mai-san.”

“Não fuja do assunto.”

“Eu te amo, por favor saia comigo”, Sakuta continuou como se não pudesse ouvi-la.

Mai continuou olhando fixamente para ele.

“Eu disse para não fugir do assunto.”

“Eu preferiria que você não ignorasse minha confissão também.”

“Eu estou cansada de ouvir isso, no entanto.”

“Entendo… este é um fracasso amoroso então. Parece que terei que procurar por outra pessoa então.”

“Hey, o qu—”

“Obrigado por tudo até hoje”, ele a interrompeu se curvando educadamente junto de um profundo e desapontado suspiro de amor não correspondido.

“E-eu não disse não… O que, você já está desistindo!?” Mai o encarou enquanto fazia beicinho.

“Você irá então?”

“Ugh… você é tão atrevido, mesmo que você seja apenas você.”

“Você irá?” Ele perguntou novamente, não desistindo.

“…Sim”, ela respondeu com uma voz quase inaudível e um pequeno aceno de cabeça, “eu irei.”

Então, como se fosse para esconder seu constrangimento, Mai silenciosamente enfiou um ovo frito na boca. Foi um ato tão adorável que Sakuta sentiu um calafrio percorrer seu corpo.

“Mai-san.”

“O-o quê?”

“Posso te abraçar?”

“E qual é o seu motivo”, Mai perguntou cautelosamente, com o olhar atento enquanto espiava ele. [NT: assim como no volume 01, a expressão usada aqui era ‘upturned eyes’ —’olhar levantado’ em português—que significa, literalmente, um formato de olho inclinado para cima. Mas dessa vez, durante a revisão, preferi trocar para uma das sensações que esse olhar passa, que seria atenção ou cautela. Dessa forma há uma melhor sonorização e a frase faz mais sentido]

“Porque você está muito fofa agora.”

“Então não, absolutamente não.”

“Ehh?”

“Você está com uma cara de que iria usar essa chance para me empurrar e me pressionar no chão… Além disso, isso não é algo para o qual eu possa simplesmente dizer ‘sim, é claro’.”

Os murmúrios de Mai continuaram a partir daí.

O encontro no almoço chegou ao fim com o sinal de aviso para as aulas e os dois partiram para suas respectivas salas de aula.

Ao longo do seu caminho, Sakuta viu alguém familiar em uma das escadarias que usou. Ela tinha um corte de cabelo short bob2, assim como o que estava atualmente na moda, e um leve toque de maquiagem em suas bochechas para adicionar um pouco de cor, dando uma suave impressão de sua expressão geral.

Seu nome era Koga Tomoe.

Ela era uma aluna do ano abaixo de Sakuta e que o havia confundido com um pervertido. O encontro entre eles havia deixado uma impressão pela qual ele conseguia se lembrar do nome dela. Na época, ele estava apenas tentando ajudar uma criança perdida a encontrar sua mãe, um ato puramente por causa da bondade em seu coração, mas mesmo assim, ela tinha gritado: ‘Morra, seu lolicon pervertido!’ e dado um forte chute em seu traseiro.

Ela era essa mesma pessoa, mas parecia ter docilmente abaixado a cabeça. Olhando mais de perto, ele viu que ela estava diante de alguém. Um garoto alto e magro. Ele tinha um bom físico e provavelmente estava em um clube esportivo. Ele tinha cabelos castanhos e estava pisando no contraforte3 dos seus sapatos de uso interno. Seu uniforme estava bastante desgastado, então ele provavelmente era um aluno do terceiro ano, o típico cara com boa aparência.

“Maesawa-senpai… sobre o que você queria conversar?” Tomoe o encarava nervosamente. Aparentemente, o garoto se chamava Maesawa.

“Diga, você gostaria de sair comigo?”

“Eh!?”

“Você não quer?”

“A-ah, um, uh… deixe-me pensar sobre isso por um tempo”, Tomoe respondeu de maneira confusa.

“Entendi, eu vou esperar por sua resposta”, Maesawa respondeu tranquilamente antes de subir as escadas. Se esbarrar com ele seria incômodo, então Sakuta rapidamente saiu em direção ao corredor.

“Ela é popular. Bem, ela é fofa”, normalmente Sakuta esperaria que isso tivesse dado ruim, mas hoje ele estava no clima de celebrar a felicidade dos outros. Afinal, ele tinha feito com que Mai concordasse em ir a um encontro com ele. “Agora… só falta o amanhã vir, e as coisas serão perfeitas.”

Essa era a maior preocupação de Sakuta nesse momento.

Naquela noite, Sakuta havia se cansado de fazer as mesmas coisas, então ele decidiu colocar uma ideia em prática, passar a noite acordado.

Quando ele havia acordado naquela manhã, o dia tinha passado para o anterior, então o que aconteceria se ele não dormisse? Portanto, tudo o que ele teria que fazer era não dormir e esperar até amanhã.

Quando chegou às duas da madrugada, Sakuta segurou um bocejo enquanto ligava a TV para se distrair. Um jogo de futebol estava sendo exibido na tela. Os jogadores usavam camisas azul-escuras, então eles eram os Samurais Azuis, o time nacional do Japão, como também eram seus titulares.

“Sério, eles estão jogando já faz dois dias seguidos…” Mesmo que tivessem uma agenda lotada, as regras deveriam permitir que eles tivessem pelo menos três dias entre cada partida… “Hmm?”

Algo chamou a atenção de Sakuta. Enquanto observava a partida se desenvolver, ele percebeu o que era.

“Eu já vi isso”, ele murmurou para si mesmo.

Era pouco antes do primeiro tempo terminar… O camisa 10 recebeu um passe no centro e rapidamente driblou a bola pela metade adversária do campo. Quando ele se esquivou de dois jogadores, um dos seus adversários o chutou por trás. O apito soou um pouco atrás da grande área, dando ao Japão uma chance de cobrança de falta.

Era a mesma cena que ele havia assistido naquela manhã nos destaques do noticiário. Mas a expressão AO VIVO estava estampada no canto superior direito da tela, então o que estava sendo exibido era uma transmissão via satélite da partida, como se isso estivesse acontecendo nesse exato momento no lado oposto da Terra.

“…Essa foi uma piada engraçada.” Ele correu de volta ao seu quarto para verificar o relógio. Juntamente com o horário das duas e dez da madrugada, a data ’27 de junho’ era exibida diante de seu rosto.

Sakuta não disse uma palavra. Ele havia baixado a guarda, pensando que já era amanhã e, pelo contrário, voltou para ontem.

Voltando para a sala de estar, Sakuta assistiu ao jogo. No apito do árbitro, o camisa 4 deu uma arrancada e chutou a bola. A bola iria se afundar naquela rede… mas quando isso parecia algo inevitável, o poderoso chute bateu na trave e ricocheteou para o campo, onde a bola foi afastada por um grande defensor adversário, negando o gol ao Japão.

“Huh? O que?” As coisas tinham acontecido de maneira diferente da qual Sakuta pensara, e ele se lembrou de uma conversa que teve com sua amiga, Futaba Rio.

“Então, é como… se o time de futebol japonês tiver um jogo e se eu apenas checar as notícias, eles ganharam, mas se eu for assistir, eles perderam?”

“Você deveria nunca mais assistir futebol novamente em consideração a nossa equipe. Não pense duas vezes.”

Isso aconteceu quando eles estavam falando sobre algo como… a observação ter uma influência no resultado, ele pensou.

“Não, de maneira alguma…”

Apenas assistir a partida não faria o Japão perder.

Praticamente rezando por eles, Sakuta continuou assistindo a partida até o apito final, apoiando-os. O Japão não conseguiu compensar a diferença de um gol e terminou o jogo dessa maneira, perdendo com um placar de 0-1.

O apresentador e o comentarista ao vivo relembraram das várias chances perdidas da equipe. Falando de como a equipe tinha o péssimo hábito de não conseguir finalizar nos momentos decisivos… este era um ponto fraco da equipe japonesa que era frequentemente discutido.

O apresentador informou Sakuta sobre como a equipe agora tinha que vencer a próxima partida, que seria contra um país veterano, para avançar da fase de grupos.

“Eu vou ter que falar com a Futaba sobre isso amanhã… Eu acho seria hoje na verdade, mas também ontem…”

Sakuta não podia fazer nada além de segurar a cabeça com as mãos enquanto se sentava sozinho na sala de estar no meio da noite.

⟡ ⟡ ⟡

No final, Sakuta percebeu que ficar de vigília era inútil e, portanto, dormiu profundamente até a manhã… ele ainda não havia desistido e teimosamente ligou a TV, onde a derrota do Japão por uma pequena margem estava sendo transmitida novamente.

“Não é realmente minha culpa, certo?”

Com uma consciência estranhamente pesada, Sakuta saiu de casa trinta minutos mais cedo do que o habitual.

Meros trinta minutos fizeram a vizinhança parecer estranhamente diferente, como se o ar estivesse de certa forma mais puro e uma mudança estranha tivesse ocorrido com as pessoas que circulavam pela Estação de Fujisawa. Parecia que havia mais trabalhadores. Em seu horário habitual, geralmente havia mais estudantes vestidos de uniforme.

O familiar passeio no Enoden tornou isso ainda mais evidente com a falta de passageiros.

Obviamente, o caminho da Estação de Shichirigahama para a escola estava vazio. Os passageiros que desembarcavam na estação não iam muito além do próprio Sakuta. Na hora do rush, os estudantes de Minegahara formavam uma coluna e marchavam ao longo da rua.

Parecia totalmente um outro lugar.

Sakuta vestiu os sapatos de uso interno no deserto hall de entrada. A falta de pessoas alterou a atmosfera da escola, ela estava silenciosa e provavelmente poderia ser chamada de tranquila.

Enquanto notava essas diferenças, Sakuta passou pelas escadas e dirigiu-se ao laboratório de física.

“Futaba, você está aqui?” Ele questionou enquanto abria a porta.

A garota em questão estava na frente da lousa. Ela era uma garota pequena, vestindo um jaleco branco em cima de seu uniforme. Esta era uma dos dois únicos amigos de Sakuta… Futaba Rio.

Ela nem sequer olhou Sakuta e, em vez disso, deu um suspiro melancólico. Independentemente disso, Sakuta sentou-se em frente a ela do outro lado da mesa.

Na superfície entre eles havia um béquer com torradas em cima e uma xícara de café com vapor saindo. A torrada possuía linhas escuras devido a grelha. Aparentemente, ela estava prestes a tomar café da manhã. O clube de ciências era um pouco relaxado demais com Rio sendo seu único membro. Rio mordeu o pedaço de torrada em suas mãos, liberando o aroma do pão quente e crocante.

“Diga”, Sakuta começou.

“Não.”

“Eu nem disse nada ainda”, ele protestou.

“Você se esforçou para vir aqui tão cedo, então será algo irritante, não é?”

Ela realmente era inteligente, ele pensou. Mas, novamente, qualquer um saberia que algo estava errado nessa situação.

“Eu venho trazendo notícias de um fenômeno fascinante.”

“E é exatamente isso que eu quero dizer com irritante”, Rio agitou a mão para que ele saísse, parecendo ser inalcançável, e disse “vá embora”.

Rio mordiscou com raiva a casca de sua torrada. Ela normalmente era calma, mas hoje estava particularmente irritada, então provavelmente estava de mau humor desde o início.

“Aliás, e quanto a você, aconteceu alguma coisa?” Sakuta ficou preocupado com isso, então perguntou sobre ela primeiro.

“Por que você acha isso?” Rio finalmente olhou para ele, seus olhos o espiando de maneira cuidadosa por trás das lentes de seus óculos.

“Porque você está irritada.”

“Eu não estou…” mas enquanto negava, ela pareceu desistir de querer fugir da pergunta e deu um longo suspiro, “Bem, acho que contar a você e deixá-lo rir seja melhor do que se preocupar sozinha com isso.”

Rio parecia estar murmurando para si mesma enquanto olhava para o além.

“Que diabos?”

Ela parecia insegura se deveria ser positiva ou negativa quanto a isso.

“Eu andei de trem com o Kunimi esta manhã.”

“Ele tentou te apalpar?”, perguntou Sakuta, com seu olhar inevitavelmente caindo em direção aos grandes seios dela.

“Kunimi não faria isso.”

“Pare de olhar para mim como se você quisesse dizer ‘diferente de você’.”

“Não olhe então”, disse Rio enquanto se movia para o lado para tentar esconder seus seios. Ela obviamente não gostava disso, então Sakuta decidiu fazer o máximo de esforço possível para não olhar.

“E então? Você andou de trem com o Kunimi e depois?”

“Então nada, eu só… eu só me odeio por ficar contente pelo fato de que um garoto com uma namorada ter conversado comigo.” Rio disse com um sorrisinho auto-depreciativo.

“Isso é apenas uma preocupação de garota.”

“E se você tivesse falado comigo, teria sido apenas como uma mosca zumbindo no meu ouvido.”

“Isso era realmente necessário?”

Definitivamente não era algo que ele considerava fazer, mas se ele conseguisse irritá-la a ponto de tirá-la dessa depressão, então isso realmente não importava.

“Eu acho que estou ficando cada vez pior.”

Rio colocou o resto da casca na boca e tomou um longo gole de sua xícara de café antes de soltar um suspiro profundo.

“E se você simplesmente dissesse?” Sakuta sugeriu.

“Dissesse o quê?” Rio perguntou em resposta, tentando se esquivar da pergunta, embora soubesse exatamente o que ele quis dizer.

“‘Eu gosto de você.'”

“…Para quem?” Ela hesitou dessa vez. Mesmo que ela perguntasse, ela sabia que nome sairia dos lábios de Sakuta.

“Para o Kunimi, obviamente”, Sakuta disse a ela, olhando firmemente em seus olhos para que ela não pudesse evitá-lo.

Rio silenciosamente fez beicinho por um momento, e quando ele pensou que ela ia se virar de lado na cadeira e desviar o olhar, ela falou de maneira mal-humorada.

“Eu não quero ouvir a sua lógica.”

“Sinto muito.”

“Você deveria mesmo.”

“Você vai manter as coisas assim, Futaba? Eu acho que você deveria fazer isso antes que você piore.”

Sakuta sabia que ela se dava ao trabalho de chegar tão cedo às atividades do clube para que assim pudesse se encontrar com o Yuuma. E mesmo assim, independentemente se conseguia ou não, ela ficava assim.

“Eu disse que não quero ouvir a sua lógica”, suspirou Rio novamente, de maneira profunda o bastante para encher uma bexiga inteira, com uma expressão melancólica, “se eu fizesse isso, eu o incomodaria”.

“Vá em frente e o incomode, aquele desgraçado legal que ele é.”

“Eu gostaria de ser tão insensível quanto você, Azusagawa.”

“Se você me elogiar tanto, eu vou começar a corar.”

“Não vou falar mais nada.”

“Homens são criaturas que se alegram com as mulheres abusando deles.”

“Isso só vale para trastes como você”, ela respondeu.

“A namorada do Kunimi é bastante insensível também.”

Ela havia dito ‘Eu sinto muito pelo Yuuma, andando com um excluído como você’ bem na cara dele. Não importa como você olhasse para isso, era por Sakuta que as pessoas deveriam sentir pena, por ter algo assim dito para ele. O nome dela era Kamisato Saki. Ela estava na mesma classe que Sakuta, a 2-1, e apesar dela não ser do seu tipo, ela era popular entre os garotos e conhecida por sua aparência. Ela era o centro do grupo de garotas fofas e populares da turma. O exato oposto de Rio, que era comum e tinha o hábito de trabalhar sozinha nos laboratórios.

“Diga, Azusagawa.”

“O que?”

“Você realmente é insensível, falando sobre ela.”

“Você precisa de medidas extremas. Se você não gosta disso, então admita a derrota logo.”

“Alguém como você não deveria estar certo.”

Rio sabia que essa era a única solução. Ela sabia disso, mas não colocava em prática, porque se ela colocasse isso em palavras, estaria tudo acabado.

“Eu sou o único que diria coisas assim.”

“O fato de você mesmo admitir só o torna ainda pior”, Rio sorriu, levemente se divertindo, e seu humor parecia ter mudado um pouco, “Sobre o que você quer falar então?”

“Estou preocupado que o amanhã nunca chegue.”

“Não há um futuro brilhante esperando por você de qualquer maneira, então isso é bom, não é?”

Ela tinha recebido uma resposta sincera, porém parecia mais como ter levado um tapa na cara.

“Não é nem um pouco bom. Eu tenho um futuro promissor à minha frente.” Ele iria começar a namorar Mai esta tarde, então não era um exagero chamá-lo de futuro promissor. “Seja como for, hoje é ontem e ontem é hoje.”

“Você poderia realmente me dizer de uma maneira que um humano possa entender?”

“Eu também sou um humano”, defendeu ele.

“Embora você seja um traste nojento?”

“Hey, isso é… ah, tanto faz. Uhm…” Sakuta desistiu de discutir e começou a explicar as coisas bizarras que tinham acontecido com ele desde o início.

Cinco minutos depois, quando Sakuta havia terminando sua explicação, Rio soltou um bocejo sonolento.

“Então, o que você acha, Futaba?”

“Isso é o que as pessoas chamariam de Síndrome do Ensino Fundamental II.” [NT: Chuunibyou, e como observação, este termo é comumente traduzido de maneira errada para ‘do ensino médio’]

“Mas eu estou no ensino médio.”

“Certo, é Síndrome do Ensino Médio então.”

“Cara, você está preguiçosa ein.”

Rio estava agindo como se tivesse feito bastante esforço. Ela preparou uma outra xícara de café e bebeu sozinha.

“Se isso não é uma ilusão, então é a Síndrome da Adolescência que você tanto ama?” Sugeriu Rio, mais uma vez com um tom de voz preguiçoso.

“Eu não amo ela nem um pouco.”

Síndrome da Adolescência era um nome comum dado a um conjunto de fenômenos estranhos que eram discutidos na internet, falsos rumores de ‘ler mentes’, ‘ter psicometria’ e outras coisas ocultistas. Ninguém sinceramente acreditava nessas coisas. Mas, Sakuta havia experimentado diversas coisas semelhantes a isso. Essas coisas poderiam ser o mesmo, ele não conseguia pensar em nenhuma outra explicação.

“De qualquer forma, faça alguma coisa”, Sakuta apelou.

“É você que vai ter que fazer alguma coisa.”

“Por que diz isso?”

“Me parece, sem dúvidas, que eu e os outros sete bilhões de pessoas no planeta não pensamos que essa é a terceira vez que hoje está acontecendo.”

O olhar de soslaio de Rio para a área externa apontava para o time de beisebol correndo. Eles estavam suando e certamente não pareciam acreditar que essa fosse a terceira vez desse dia. Se acreditassem, então eles não estariam continuamente se esforçando em seu treinamento.

“E é nesse momento que eu entro em pânico.”

Rio estava antes usando o celular e agora mostrava a tela dos resultados da pesquisa. As palavras-chave que ela havia usado eram ’27 de junho’, ‘terceira vez’ e ‘repetindo’. Infelizmente, não havia resultados à mostra.

“E por isso, acho que este é provavelmente um caso de Síndrome da Adolescência causada por você”, Rio disse calmamente, dando a Sakuta a notícia desagradável.

“Eu não estou mentalmente instável o suficiente para ter a Síndrome da Adolescência, e eu não estou realmente sob nenhum estresse.” Essas eram as coisas sugeridas na internet como causas da Síndrome da Adolescência. O alto nível de estresse causado pela realidade estar contra uma pessoa, ou a ilusão disso, era a explicação mais provável. Em essência, era uma fuga da realidade.

“Bem, tudo bem se você não estiver consciente disso”, aparentemente Rio tinha certeza de que Sakuta estava causando isso, “seja qual for a causa, se você tiver outras ideias sobre o que está acontecendo, vá em frente e diga-as.”

“O que você quer dizer?”

“Se sua explicação anterior for tudo o que tem, então eu acho que você está dando voltas no tempo.”

“Sim, é isso mesmo”, ele respondeu.

Loops temporais eram bastante comuns em histórias de ficção científica.

“Seria melhor se você não se envolvesse com esse conceito.”

“Por quê?”

“Há muitos problemas com voltar ao passado”, já que ela não disse que era impossível, significava então que havia alguma teoria para isso, “os múltiplos dias que são todos ‘vinte e sete de junho’ que você tem experimentado podem ser algo como olhar para o futuro a partir de um ponto anterior.”

Rio havia feito uma afirmação chocante. Essas não pareciam ser palavras que viriam de uma garota a qual dissera que era difícil viajar para o passado.

“Isso soa como se você estivesse facilmente aceitando a clarividência.”

“Ela tem maior probabilidade de acontecer do que retornar ao passado.”

“Sério?”

“Com tudo isso dito, esta é uma ideia que surgiu antes da mecânica quântica entrar em uso… ela veio da física clássica.” Sakuta fez um barulho em atenção às palavras de Rio. “Você já ouviu falar do Demônio de Laplace?”

“Infelizmente não estou familiarizado com nenhum demônio.”

“Tudo bem se você nunca ouviu falar… Tudo o que existe dentro deste universo cai sob as mesmas leis da física, tudo bem até aqui, certo?”

“Sim, isso é a física em si, certo?”

“Sim. Se você colocar essas leis em fórmulas e realizar os cálculos, você poderá prever o estado futuro de um sistema.”

Era uma explicação simples, mas não parecia funcionar assim na realidade e então Sakuta inclinou a cabeça para o lado.

“Para deixar isso mais claro, se você soubesse a posição e a energia de todos os átomos… ou seja, a massa e a velocidade de cada um, você poderia usar isto em fórmulas clássicas para determinar o estado futuro deles. Isso usa coisas que você aprende no ensino médio.”

Era muito lamentável, mas Sakuta, apesar de frequentar a mesma escola que Rio, não tinha a menor ideia do que ela estava falando. Havia uma miríade de perguntas que ele gostaria de fazer para verificar as coisas.

“Todos os átomos devem representar um número absolutamente enorme”, ele começou com isso. O número deveria ser grande o bastante para que você pudesse chamá-lo de infinito.

“E representa.”

“Então, é sequer possível conhecer a posição e energia de cada um deles?” Era difícil descobrir quantos grãos formavam um bolinho de arroz, imagine algo ainda maior.

“Pelo menos, naquela época… no século XIX, os físicos não conseguiam fazer isso. Mesmo que tivessem sido capazes reunir toda essa informação, calcular os resultados das fórmulas a partir dessa vasta quantidade de dados levaria uma quantidade de tempo igualmente grande. Então, prever um segundo no futuro levaria mais de um segundo, então eles não conseguiriam prever o futuro próximo.”

“Entendi.”

Provavelmente, também seria impossível fazer isso com computadores modernos.

“Então, o físico Laplace pensou em uma existência fantasiosa que conseguia fazer isso.”

“E esta seria o Demônio de Laplace?”

Rio assentiu lentamente com a cabeça antes de continuar.

“Esse demônio possui a habilidade de conhecer instantaneamente a posição e a energia de todos os átomos existentes, e usar essas informações para calcular o futuro. Em outras palavras, o Demônio de Laplace consegue ver tudo no futuro.”

“Hmmmm”, Sakuta respondeu.

“Você não parece concordar.”

“Não é isso, calcular o futuro seria ótimo, mas então nossos pensamentos não mudariam ele? Você pode chamar isso de previsão?”

“Ah, então é isso.”

“Você não pode prever emoções, certo?”

“Você pode”, Rio refutou de forma clara.

“Huh?” Foi a única coisa que conseguiu sair pela boca de Sakuta.

“Os corpos humanos são feitos de átomos também. Se você conhece a posição e energia de cada um deles, você pode determinar como o cérebro irá se alterar ou como a pessoa irá se sentir.

“Entendo… eu gostaria de não ter perguntado.”

“Se você ir até o fim, não vai querer mesmo ter perguntando.”

“Mesmo? Mas pelo que você disse… se levar em consideração as emoções, então, conhecendo a posição e a energia de todos os átomos nesse momento, você poderia prever como as coisas se desenvolveriam, certo?”

“Certo.”

“Então, isso não significaria que o futuro já estava definido?” Se você conhecesse a posição e energia de todos os átomos, então todo o resto era apenas uma questão de tempo, não haveria necessidade de medir qualquer outra coisa. Em outras palavras, nada além do tempo mudaria. A física e a matemática determinariam o imutável destino.

“Estou impressionada que você percebeu isso, muito bem, Azusagawa!” Rio o elogiou assim como faria com uma criança. “Isso está absolutamente correto, é o que nossa conversa até o momento vem sugerindo.”

“E ai? Independentemente de eu estudar ou não, eu receberei a mesma nota no exame na próxima semana?”

“Não exatamente. As notas com certeza já estão definidas. Mas não é devido à escolha entre estudar ou não, na verdade, se você estuda ou não em si já está decidido.”

“Hmm, ah, sim.”

O futuro estar definido na verdade significava isso.

“Digamos que você tenha decidido que ‘o futuro está definido, não vou me incomodar em tentar’ quando ouviu o que eu disse a você.”

“Mesmo assim, o Demônio de Laplace não saberia que eu ouviria tal coisa e tentaria lutar contra isso?”

“Exatamente.”

Era complicado, mas ele entendeu. Mas então…

“Se é esse o caso, nossos destinos não estão, portanto, predestinados?” Ele perguntou.

“Você esqueceu o que eu falei no começo?”

“Que você estava super feliz que Kunimi falou com você.”

“Morra.”

“Umm… que isso ‘surgiu antes da mecânica quântica entrar em uso’, certo?”

“Se você se lembra, então pare de fazer palhaçada.” Rio o encarou de maneira levemente irritada. Uma expressão feminina inimaginável a partir de seu habitual comportamento franco. “Eu expliquei sobre o gato de Schrödinger para você antes.”

“Aquele em que o gato pode estar tanto vivo quanto morto até que você abra a caixa?”

Era isso que ele havia ouvido quando perguntara sobre o que estava acontecendo com o caso de Síndrome da Adolescência de Mai.

“Bem, bom trabalho em se lembrar disso.”

“Me elogie mais.”

Rio o ignorou e continuou.

“Você se lembra de eu ter explicado que na mecânica quântica as posições dos átomos só podem ser determinadas probabilisticamente?”

“Agora eu me lembro. Para obter a posição, você tem que observá-lo… É isso, não é?”

“Isso mesmo. Então, a observação é a chave para isso, e para observá-lo você precisa de luz.”

Rio tirou uma lanterna de uma gaveta e apontou para uma bola de beisebol sobre a mesa.

“Isso seria para descobrir a posição do átomo então?”

“Sim, porém os átomos são muito pequenos, portanto, se eles forem atingidos pela luz, a velocidade deles irá se alterar.” Rio rolou a bola pela mesa até a borda, onde caiu e quicou duas vezes, até parar na perna da cadeira. “E assim, se encontrar a posição de um átomo altera sua velocidade, isso implica que para conhecer sua velocidade e, portanto, sua energia, a posição dele se torna probabilística novamente. Não há como saber os dois.”

“Isso é irritante.”

“E agora está claro que o Demônio de Laplace foi erradicado pela mecânica quântica, o que é uma prova de que o futuro não está definido. Você está aliviado agora?”

Honestamente, ele não conseguia se sentir aliviado. Sakuta não conseguia realmente entender a mecânica quântica e não podia confiar em algo que ele realmente não compreendia.

“Mas a mecânica quântica é sobre a observação humana, certo?”

“Claro que é.”

“Então—”

“Eu sei o que você quer dizer, que o Demônio de Laplace está muito além dos seres humanos, e que ele possa então saber as duas coisas”, Rio abriu a boca e antecipou-o com um olhar confiante.

“Sim, isso é exatamente o que eu queria dizer.”

“Você pode decidir quanto melhor o demônio é comparado aos humanos.”

Rio parecia ter passado por toda essa conversa apenas para dizer isso, e ao mesmo tempo, estava dizendo que o próprio Sakuta era o Demônio de Laplace.

“Eu não sou um demônio malvado como esse.”

“Apenas certifique-se de não ser dissecado.”

“Eu vou ficar bem contanto que você não me venda para algum grupo sombrio de cientistas.”

“Se eu fizesse isso, talvez nós não conseguíssemos mais nos ver”, disse Rio com o olhar em seu telefone sobre a mesa, “se você insiste que não é você, então você precisa encontrar o verdadeiro Demônio de Laplace”.

“Onde você acha que ele está?”

Eles não foram ensinados a encontrar demônios em suas lições pelo menos.

“O demônio, junto com você, terá lembranças dos dias se repetindo, certo? Então ele talvez tome ações diferentes daquelas tomadas no último dia 27 de junho, eu imagino.”

“Ahh, entendo …” Rio estava absolutamente correta, notando que seria bastante provável que a pessoa tentasse agir contra isso, ou ficasse confusa com a situação.

Embora isso tivesse sito dito, ele não possuía um verdadeiro alvo, não sabendo por onde procurar.

Sakuta colocou sua mochila nos ombros e se levantou, estendendo a mão para ajudar Rio a se levantar, mas ela apenas disse.

“Vá em frente.”

“Obrigado então”, ele disse, e quando chegou à porta e estava prestes a sair, ele se lembrou de algo e parou ali, “Ah, certo, Futaba?”

“O que?”

“Se hoje acontecer novamente, você quer que eu faça algo para que você não se encontre com o Kunimi esta manhã?”

Nesse caso, Rio não iria parecer tão melancólica nessa manhã.

Rio permaneceu em silêncio enquanto pensava por um momento.

“Você não precisa se preocupar”, ela disse com um leve sorriso, “eu mesma vou fazer algo em relação a isso.
É mesmo, você me deve bastante, então eu preciso me certificar de que você vai me pagar de volta.
Eu vou me lembrar dos juros também.” [NT: estas três frases estavam separadas no material em inglês, mas preferi juntá-las assim por aparentarem terem sido todas ditas por Rio]

Sakuta deixou o laboratório de física enquanto Rio o observava com um sorriso cínico.

⟡ ⟡ ⟡

“Você precisa encontrar o verdadeiro Demônio de Laplace.”

Rio lhe havia dito isso, mas por onde diabos ele começava? Ele não tinha a menor ideia de quem seria o demônio e, além disso, não havia garantia de que ele estaria próximo do mesmo. Na pior das hipóteses, o demônio poderia ser alguém que vivia do outro lado do mundo.

“É o meu fim se ele estiver…”

Ele era um mero estudante do ensino médio, e não tinha dinheiro o suficiente para atravessar o mundo ou para sequer ter um passaporte. Suas chances eram desanimadoras. Na verdade, deprimente talvez fosse um termo melhor.

Seu humor havia despencado.

Mesmo assim, ele se dirigiu para a sala de aula do terceiro andar quando chegou o intervalo para cumprir a promessa de almoçar com Mai na sala vazia.

Nesse momento, a coisa mais importante para Sakuta era namorar Mai. Até mesmo isso estava sendo apagado da existência. Mais uma vez, chegaria a hora dele ir comer o bentô feito a mão por Mai e se confessar para ela. Havia ao menos a salvação por esse momento ser por si só divertido.

Sakuta alegremente abriu a porta da sala de aula ao deslizá-la. Nesse momento, ele ouviu sons de dentro do que ele tinha certeza ser uma sala de aula deserta. Procurando, ele conseguiu ver um traseiro coberto por uma saia nas sombras da mesa do professor. Aparentemente, essa pessoa estava tentando se esconder. Um forte mal-estar percorreu por suas costas.

Isso não havia acontecido na primeira ou segunda vez. Em ambas as ocasiões, Sakuta tinha chegado logo no início do almoço, seguido logo depois por Mai, e tendo após isso um almoço agradável. Ninguém havia os interrompido, e Sakuta não encontrara ninguém além de Mai na sala.

E, portanto, este era um desenvolvimento diferente da primeira e segunda vez que ele havia vivido este dia, a influência de alguém tomando ações diferentes.

As palavras de Rio nessa manhã passaram pela mente dele.

“O demônio, junto com você, terá lembranças dos dias se repetindo, certo? Então ele talvez tome ações diferentes daquelas tomadas no último dia 27 de junho, eu imagino.”

E então, diante de seus olhos, havia uma situação que se encaixava perfeitamente nessas palavras.

“Aí está você, Demônio de Laplace”, disse Sakuta, e em resposta, a garota se escondendo timidamente espiou a cabeça para fora, como um pequeno animal saindo de seu ninho e verificando se havia perigo.

Sakuta reconheceu seu rosto. Ele era marcado por um corte short bob da moda, tinha grandes olhos redondos e um toque de maquiagem que dava uma impressão suave e fofa. Uma aura de ‘especialista na última moda’ emanava a partir de todo o seu corpo, revelando-a como uma garota que se encaixava na imagem invocada pela expressão: a garota do ensino médio.

Ela estava com seu smartphone, que tinha uma capinha rosa-salmão, em uma mão, e sua boca estava aberta prestes para começar a falar. Esta era a aluna do primeiro ano, Koga Tomoe.

Ela era pequena, mesmo para uma garota mas pelo jeito isso não era grande coisa para ela, então ela parecia um pouco fraca para ser chamada de demônio. Ela estava mais para um diabrete, uma diabinha.

A brisa do mar soprando da janela aberta fez o cabelo e a saia de Tomoe balançarem um pouco, e ela quebrou o silêncio.

“Satou Ichirou.”

“Esse é um pseudônimo que uso para me esconder do mundo”, respondeu Sakuta, surpreso por ela ter se lembrado do nome falso que ele havia dado quando se apresentou pela primeira vez. Aparentemente, ela era do tipo que se lembrava do nome de alguém quando o conhecia, diferentemente de Sakuta.

“…Você é o Azusagawa-senpai, não é?” Ela perguntou, com um olhar tímido.

“Azusagawa Sakuta, segundo ano.”

“Eu sou Koga Tomoe. Estou no primeiro ano”, disse ela, mudando para um tom forçado, mas educado, dando uma impressão mais mansa.

“Você pode conversar casualmente, afinal, somos parceiros de chutar a bunda um do outro.”

“Esqueça isso!” As bochechas de Tomoe se incharam formando um beicinho, voltando à imagem que Sakuta tinha dela. Talvez por se lembrar da dor daquele dia, as mãos de Tomoe cobriram o próprio traseiro, fazendo uma pose que não parecia se encaixar em uma kouhai.

“Koga, eu tenho uma pergunta estranha.”

“O que?”

“Quantas vezes você viveu hoje?”

Os olhos de Tomoe se arregalaram com a pergunta de Sakuta, se movendo de um lado para o outro por surpresa e um pouco de apreensão.

“É a minha terceira”, ele disse.

Com isso, ela assentiu e então disse:

“É a minha terceira também”, levantando três dedos. Naquele momento, a expressão dela se transformou instantaneamente em lágrimas e antes que Sakuta pudesse reagir ela continuou com, “não era… só eu”.

Lágrimas começaram a cair de seu rosto e ela caiu no chão, fosse por alívio ou por se sentir sobrecarregada.

“O que diabos é isso?”, ela gritou.

“Quem sabe.”

“Por que o dia está se repetindo?”

“Sei lá.”

“Por que você não sabe!?”

“Eu não posso evitar não saber as coisas.”

Seu alívio de agora pouco voltou a se transformar em apreensão.

“Eu pensei que você poderia me ajudar, me devolva minhas lágrimas!”

“Basta ir beber um pouco de água da torneira.”

“O que eu faço agora?” Ela perguntou, mas na verdade Sakuta queria perguntar isso a si mesmo. “O que eu vou fazer?” Ela perguntou novamente, com um tom de voz pouco familiar. Ela não parecia entender a causa da situação em que estava, você poderia chamá-la de ingênua.

“Por que você está tão calmo?” Ela reclamou dessa vez, fortemente segurando sua gola e sacudindo-o.

“Apavorar desse jeito irá ajudar?”

“Não vai, mas é algo natural.”

“É mesmo?”

“Claro que é, você que tem problemas, Senpai. Mas imagino que um louco que se confessou na frente de toda a escola teria mesmo.”

“Eu acho que falar para outra pessoa que ela ‘tem problemas’ bem na cara dela também é um sinal de ter.”

“Cala a boooca.”

“Só para garantir se você sabe de algo, você tem alguma ideia do que está acontecendo?”

“Não faço ideia.”

“Nenhuma?”

“E-eu não sei de nada.”

“Você é inútil.”

“Não, você que é!”, ela insistiu.

“Aconteceu algo desagradável ou você teve algo te preocupando recentemente?”

“Por que eu tenho que te contar sobre isso? Ah, uma mensagem.” Ela imediatamente olhou para o celular.

“Porque… isso parece ser a Síndrome da Adolescência. Se ela está sendo causada por um estado mental instável vindo de você, resolver essa causa deve resolver isso também.”

“Síndrome da Adolescência… Senpai, você está bem?” Ela perguntou ironicamente, com o olhar ainda fixo em seu telefone enquanto deslizava os dedos ao redor da tela, digitando rapidamente. “Isso é apenas um rumor online. Eu não posso acreditar que você acredita nisso.”

A razão pela qual Sakuta acreditava que isso existia era por causa de suas experiências inacreditáveis ​​com tal fenômeno no passado.

O caso que envolveu sua irmã Kaede foi o primeiro. Como se ela tivesse sido atacada, hematomas tinham se originado em sua pele apenas por ela ter olhado as cruéis publicações e mensagens vindas das suas colegas, e ele havia até mesmo visto com os próprios olhos cortes que pareciam ter sido feitos com uma faca.

Um mês antes, ele tinha visto as circunstâncias ao redor de Mai e até mesmo se esquecido dela. E agora, essa situação seguia esta tendência.

“Eu sei como você se sente, mas depois de viver o mesmo dia três vezes, duvido que a Síndrome da Adolescência seja apenas uma lenda urbana.”

“Ugh, isso é verdade…” Havia um limite em escapar da realidade e se perguntar se você estava sonhando. Com Tomoe na mesma situação, isso estava ficando cada vez mais realista. Este poderia ser apenas um caso de ver o futuro assim como Rio sugeriu, mas ele com toda certeza parecia ser fisicamente real.

“Além disso, pare de mexer no celular enquanto estamos conversando”, repreendeu Sakuta enquanto arrancava o celular das mãos de Tomoe.

“Ah, me devolva!” Tomoe gritou enquanto saltava e tentava pegar o celular, o qual Sakuta segurava acima de sua cabeça, fora do pequeno alcance dela, “Eu não vou conversar e usá-lo ao mesmo tempo!”

Ela estava admitindo seu erro, então ele devolveu.

“Aqui.”

Como um cauteloso animal selvagem, ela esticou a mão para a frente e pegou o celular, começando a usá-lo imediatamente em silêncio.

O silêncio se estendeu entre eles por diversos segundos.

“Então você vai parar de falar?”

“Quieto, você está me distraindo.”

“Cara, vocês garotas.”

E assim, Sakuta esperou por cerca de vinte segundos.

“Então, o que você quer?” Tomoe perguntou, finalmente tirando o olhar da tela.

“Aconteceu algo desagradável ou você teve algo te preocupando recentemente? Isso pode nos dar uma pista de como quebrar essa repetição do dia vinte e sente.”

“…Hmmm.” Ela franziu a testa, pensando seriamente, e depois de uns dez segundos, respondeu de maneira muito séria e levemente corada. “Eu ganhei um pouco de peso.”

Olhando para ela, Tomoe era bastante pequena e delicada. Ela poderia ser chamada de magra nos vários sentidos da palavra.

“P-por que você está me olhando assim?” Ela questionou enquanto tremia.

“Está tudo bem. Se eu fosse dizer, você é bastante magra de qualquer maneira. Se você ganhar um pouco de peso, você talvez ganhe um pouco de carne nessa sua tábua de lavar roupa.”

“Isso é porque tudo vai para o meu estômago e traseiro.”

Agora que ela havia dito isso, a cintura e o traseiro dela eram bem carnudos.

“Aparentemente eles crescerão se você acariciá-los.”

“Eu já tentei isso”, ela insistiu, com suas mãos inconscientemente massageando os seios, desatenta ao olhar de Sakuta.

“Desista então. Os homens não se apaixonam pelas garotas por causa dos seios de qualquer maneira. Algo mais? Algo menos irrelevante?”

“As aulas de natação vão começar, então isso não é de maneira alguma irrelevante! Eu não tenho busto, nem mesmo uma cintura fina, o verão é um inferno…”

Ela parecia estar prestes a continuar, mas então seus olhos se arregalaram novamente e ela ficou em silêncio antes de deixar escapar um pequeno som enquanto olhava para trás de Sakuta… em direção ao corredor.

“S-se esconda!” Ela insistiu, arrastando-o pelos braços e empurrando-o para baixo da mesa do professor.

“Do que você está brincando?”

“Apenas faça isso!”

Tomoe o seguiu para dentro do estreito espaço sob a mesa. Ela estava praticamente montada sobre Sakuta enquanto ele estava deitado no chão.

Isso provavelmente era algum tipo de brincadeira popular entre os alunos do primeiro ano. Sakuta realmente não entendia os jovens.

Com suas dúvidas em mente, ele observou o que estava acontecendo e viu um garoto olhando pela porta aberta. Era o aluno do terceiro ano que havia se confessado para Tomoe no último dia… Ela havia o chamado de Maesawa-senpai, ele pensou.

“Esconda a sua cabeça!”

Tomoe agarrou o rosto dele entre as mãos e o puxou de volta para baixo da mesa.

“Ele está procurando por você, não é?”

“Eu acho que sim… mas eu enviei uma mensagem dizendo que eu tinha um compromisso na hora do almoço…”

“Um compromisso? Não me parece que você tem um”, provocou Sakuta de maneira cadenciada.

“Foi mais ou menos isso o que eu disse.”

Em outras palavras, ela havia mentido para ele.

“Pare de enrolar e vá logo ouvir a confissão.”

“Como você sabe disso?”

“Eu vi você na última vez.”

O pequeno rosto de Tomoe estava bem na frente de Sakuta. As respirações saindo pelos lábios rosados ​​e brilhantes dela estavam fazendo cócegas em suas bochechas e ele se moveu para que não houvesse qualquer contato entre os dois em algum lugar constrangedor.

O movimento surpreendeu Tomoe e ela soltou um leve grito como se tivesse sido espetada em algum lugar sensível, mas a causa era algo diferente. Era o celular dela vibrando em sua mão, com a luz da tela piscando devido a outra mensagem.

“Que tipo de brincadeira é essa?”, perguntou Sakuta.

Concentrando-se em seu celular, Tomoe não respondeu.

Enquanto esperava ela terminar, seu olhar foi para baixo, ele percebeu que a saia dela havia se levantado e que era possível ver o tecido branco na base da perna direita dela.

“Oi, Koga.”

“Depois.”

“Eu posso ver sua calcinha.”

“Agora não é a hora”, ela descartou seu aviso.

“Eu não entendo as garotas”, ele lamentou.

Aparentemente, enviar uma mensagem era mais importante do que seu senso de honra. Sem escolha, ele estendeu a mão e arrumou a saia para ela. Agora tudo o que ele podia ver eram suas coxas.

Enquanto isso, ela parecia ter terminado de mandar mensagens.

“Por que estamos nos escondendo?” Ele perguntou.

Não deveria sequer haver necessidade de Sakuta se esconder também.

“Porque… Rena-chan admira o Maesawa-senpai”, Tomoe respondeu com uma voz baixa, e seu olhar dizia ‘você deve entender agora’. Sakuta, por outro lado, não entendeu nada e, é claro, respondeu com:

“Huh?”

Tomoe repetiu este mesmo som antes de questioná-lo.

“Como assim você não conseguiu entender?”

“Porque você na verdade não explicou nada.”

“Bem, um… eu costumo ir assistir com a Rena-chan ao treino do clube de basquete.”

“E quem é essa Rena-chan mesmo?”

Ela provavelmente era alguma atriz nacionalmente famosa ou algo do tipo.

“Minha amiga… Kashiba Rena-chan. Ela disse que ele é bonito e… eu apenas assisto com ela…”

Nesse momento, Tomoe começou a murmurar.

“E você faz mais o tipo dele?”

“…S-sim”, disse ela com um aceno devagar.

“E você gosta dele?”

“Não… eu não gosto de caras populares.”

“Então vá logo ser confessada e rejeitá-lo.”

Não havia necessidade de continuar se escondendo, ela só precisava rejeitá-lo. O festival cultural estava se aproximando, então seria o momento apropriado para um cara bonito, que parecia ter subitamente começado uma banda, ser rejeitado.

“Isso definitivamente me faria ser excluída! Ele é o cara que a Rena-chan… minha amiga gosta, sabia?”

“Huh? E qual é o problema, não é como se você fosse namorar com ele.”

“Eu obviamente não posso ouvir uma confissão dele.”

“Eu não entendo o que você quer dizer.”

“Eu prometi a Rena-chan que eu iria apoiá-la… e então, se ele se confessar para mim, seria algo completamente errado”, a voz de Tomoe ficou séria, “sério, o que eu faço…?”

Seu rosto havia ficado pálido e isso certamente parecia ser como uma crise para ela, do fundo do seu coração.

“Você mostrou a ele esse olhar sedutor4?”

“É claro que não!”

“Nós seremos pegos se você gritar.”

Ela ficou surpresa e nesse momento, embora já fosse tarde demais, cobriu a boca com as mãos.

“D-de qualquer maneira, você entendeu agora, não é?”

Ele entendeu o que ela havia dito, mas não conseguia concordar com o senso de valores dela.

“Nem um pouco.”

“Caramba, não adianta falar com você!” Tomoe se levantou devido a suas emoções. Mas é claro, eles estavam debaixo da mesa, então ela tinha que tomar cuidado com sua cabeça.

“Ah, espera …”

O aviso imediato de Sakuta foi tarde demais e a cabeça de Tomoe bateu na mesa. O impacto foi forte o bastante para levantar duas das pernas desta, inclinando-a na direção contrária da lousa.

Tomoe foi muito lenta para alcançá-la depois de notar, sua mão rodopiou através do ar, e a mesa caiu com um poderoso estrondo.

Tomoe também caiu, seus pés ficaram presos nas pernas de Sakuta, que estava deitado no chão, e ela perdeu o equilíbrio, caindo com um grito.

Reflexivamente, Sakuta esticou os braços para pegá-la. Ela era incrivelmente leve e definitivamente não precisava se preocupar com seu peso.

“Francamente, você…”

07

Ele ia terminar com “deveria se acalmar um pouco”, mas não conseguiu terminar a frase, porque quando começou a falar, ele viu alguém.

Ele encontrou o olhar de um garoto na porta, o aluno do terceiro ano que ele havia visto antes. Maesawa-senpai, que aparentemente estava no clube de basquete.

O garoto estava com uma expressão incerta, com traços de confusão. Isso era compreensível, do ponto de vista dele, Sakuta e Tomoe estavam se abraçando no chão de uma sala de aula vazia.

“Então foi isso que você quis dizer. Você tem um gosto de merda.”

Aparentemente, ele tinha imensamente mal interpretado as coisas. Além disso, ele estava sendo bastante rude.

“Não, isso não é…” Sakuta começou a tentar explicar, mas sua voz desapareceu quando ele ouviu um som vindo da outra porta da sala.

Seu coração martelava em seu peito, uma involuntária reação que acompanhava seu pânico. Seus instintos estavam gritando para ele.

Mesmo sem se virar para checar quem havia feito o barulho, Sakuta sabia, ele sabia muito bem.

Hesitantemente, ele se virou para olhar.

Assim como ele pensou, Mai estava de pé lá.

Havia uma sacola de papel em sua mão, contendo o almoço que ela havia feito para ele. Ele até mesmo sabia o que havia naquele almoço, frango temperado e frito, ovos fritos, algas marinhas e feijão cozido, e salada de batata guarnecida com tomates cereja…

Ele sabia de tudo isso, mas também tinha certeza de que não seria capaz de experimentá-los hoje ao observar o olhar de Mai.

Ela não havia dado um único passo da porta e estava o observando com um olhar nada amigável. Observando enquanto ele segurava Tomoe… Observando com uma expressão de completo desinteresse…

“Isso é um mal-entendido”, Sakuta tentou dizer a ela a verdade nua e crua. Sua coragem estava sendo testada aqui, tudo o que ele podia fazer era permanecer calmo e explicar a realidade por trás da situação sem gritar.

Ela não deu resposta.

Ele a olhou bem nos olhos, visualmente declarando sua inocência.

Mas ela se virou silenciosamente e saiu.

“Argh, espere, Mai-san!” Ele gritou, empurrando Tomoe para o lado e correndo até ela. Ignorando o grito de dor de Tomoe quando ela bateu a cabeça na mesa que estava no chão, “Por favor, deixe-me explicar.”

“Não fale comigo, seu mulherengo lolicon.”

Essas foram as únicas palavras que ela o poupou antes de ir embora.

“Argh, ela está realmente irritada.”

Eles definitivamente não comeriam juntos hoje, e se confessar e obter algo como um ‘sim, é claro’ seria ainda mais difícil.

Ele soltou um suspiro de aceitação.

Quando ele verificou a outra porta, Maesawa-senpai também tinha ido embora. Tomoe ainda estava no chão, então ele ofereceu uma mão para ela.

“O-obrigada.”

Ele então colocou essa mesma mão na cabeça dela e bagunçou o cabelo por vingança.

“Wah! Hey!” Ela rapidamente se afastou dele e então passou as duas mãos pelo cabelo, colocando-o em ordem novamente antes de encarar Sakuta. “Eu me levanto às seis para arrumá-lo desse jeito, todo dia!”

Garotas na moda realmente acordavam cedo de manhã. Ele então ignorou Tomoe e respirou fundo.

Entrar em pânico não ajudaria em nada. Não havia sentido em se irritar com o que tinha acontecido. Se ele pensasse bastante sobre a situação, ele deveria naturalmente encontrar uma solução.

“Bem, tanto faz. Provavelmente vou repetir isso de qualquer maneira.”

Tomoe certamente aparentava ser o Demônio de Laplace, mas ele não podia realmente afirmar que eles tinham chegado ao fundo do problema. Obviamente, eles não haviam encontrado nenhum método para começar a resolver isso, portanto, não importava o quão brava Mai estava, se amanhã… ou melhor, o quarto dia ocorresse bem, então tudo seria resolvido. Ele só precisaria ter cuidado para não acabar abraçando Tomoe.

Nada mais era necessário, essa era uma solução maravilhosa.

Mas assim que amanhecesse, Sakuta iria se arrepender da decisão que fez aqui e agora…

 


↑ [1] Odakyu: com o nome de Odakyu Electric Railway Co., ou OER , é uma grande empresa ferroviária com sede em Tóquio. Dentre suas linhas em operação, há a Estrada de Ferro Elétrica de Enoshima, comumente chamada Enoden.

↑ [2] short bob: o corte bob é uma releitura do famoso corte chanel, que é conhecido por ser um corte de cabelo curto acima dos ombros. O bob é considerado ser uma versão mais moderna e sensual comparada ao chanel, e o short bob nada mais é do que uma versão mais curta.

↑ [3] contraforte: é a parte de trás do sapato, onde fica o calcanhar. Basicamente, ele não estava vestindo corretamente os sapatos e pisando com o calcanhar sobre a parte traseira deles. Aparentemente há um verbo para esta ação—encontrei pouca informação sobre e preferi não usar—que é ‘acalcanhar’.

↑ [4] nesse trecho, Sakuta na verdade fala ‘doe eyes’. Este termo pode ser traduzido para ‘olhos de gazela’ e é usado para descrever o olhar sedutor, mas ao mesmo tempo inocente, de uma mulher. Pesquisei mais a fundo e vi que o termo vem da poesia árabe e explica como os caçadores (uma metáfora para homens) podem morrer de amor após um simples olhar da gazela (uma metáfora para mulher). A expressão também pode significar que o caçador sucumbiu ao feitiço da gazela antes que ela ficasse enfeitiçada por ele.

Um comentário em “Seishun Buta Yarou Series – Volume 02, Capítulo 1”

Deixe um comentário